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30/06/2011 – Atualizado em 31/10/2022 – 9:10am

Fornecedores consideram que a alta concentração do varejo é negativa, pois pode reduzir o poder de barganha

Setores agroindustriais estão preocupados com a possível fusão entre os gigantes Pão de Açúcar e a operação brasileira do Carrefour. Representantes de fornecedores de leite longa- vida, trigo, carne bovina e café torrado e moído consideram que a alta concentração do varejo é negativa em termos de negociação, por causa da perda do poder de barganha. Também pode ser ruim para o consumidor final, na avaliação desses setores, pois a concentração nem sempre representa preços mais baixos nas prateleiras dos supermercados.

De acordo com dados da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), a mercearia seca (cereais, farináceos, grãos etc) representa a principal seção em termos de faturamento, com 23,4% do total em 2010. Os perecíveis (frios, laticínios, congelados) estão na sequência, com 13,8% de importância. Com análise separada dos demais perecíveis, o açougue teve 7,6% de participação e a seção de frutas, legumes e verduras ficou com 6,1% de representatividade. Outra área de peso para o setor foi a mercearia líquida, com participação de 12,2%.

Já o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, disse que vê "com mérito" uma associação entre o grupo Pão de Açúcar e a rede Carrefour no Brasil. "Abriria uma porta importante para a colocação de produtos industrializados brasileiros no mundo inteiro", afirmou Pimentel, durante audiência pública na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara.

O ministro explicou, no entanto, que ainda não está decidido se o Bndes participará da operação com até R$ 4 bilhões, como foi noticiado. "A diretoria ainda está examinando", disse. Ele acrescentou que na sua opinião a operação não estaria fora dos padrões daquelas normalmente realizadas pelo banco.

Pimentel fez estas observações em resposta ao deputado Duarte Nogueira (PSDB-SP) que questionou a intenção do governo de aportar recursos em um setor já consolidado, como é o varejo. Ao ouvir as repostas de Pimentel, o deputado alertou que a abertura de um canal comercial entre Brasil e França facilitaria a entrada de produtos importados daquele país, muito mais do que estimularia a exportação de produtos brasileiros. "O que está acontecendo não é a internacionalização do Pão de Açúcar, e sim a sua desnacionalização", afirmou Nogueira.

A ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, disse que "não há recurso público" do Bndes na fusão. Segundo a ministra, esta é uma ação de mercado do BndesPar, braço de participações do banco em empresas privadas, e não passa pelo crivo do governo. A declaração da ministra foi feita após participar de reunião no Palácio do Planalto da Câmara de Políticas de Gestão na companhia de Abilio Diniz e outros integrantes do colegiado.

O coordenador da câmara, o empresário Jorge Gerdau, tentou não comentar o assunto, mas afirmou que as fusões são uma "tendência mundial". Ele disse ainda que cabe ao Cade avaliar a concentração de mercado. "É uma operação de mercado, e não de financiamento público."
Oposição critica participação do Bndes na operação

A oposição no Senado criticou a participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes) no processo de fusão das redes de supermercado Carrefour e Pão de Açúcar. A base do governo considera normal a operação e disse que ela poderá contribuir para tornar o Pão de Açúcar uma empresa internacional.

Para o líder do PSDB, senador Álvaro Dias (PR), a política que vem orientando as ações do banco desvirtua a função social para a qual ele foi criado. "Achamos um absurdo. É preciso que pelo menos retirem o "s" do Bndes. Essa orientação na aplicação dos recursos exclui a hipótese de um banco social. O que há é um banco privilegiando megaempresários no País com recursos públicos", disse Dias.

Segundo ele, os contribuintes têm financiado o subsídio de juros para os empresários próximos ao governo, por meio das transferências de recursos do Tesouro para o banco. "O governo já transferiu cerca de R$ 260 bilhões do Tesouro da União para o Bndes, subsidiando juros que beneficiam apenas os mais próximos do poder, ou seja, estabelecendo uma distinção entre empresários de primeira categoria e segunda categoria."

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), defendeu a participação do banco no negócio. Segundo ele, essa é uma operação comum de mercado na qual o Bndes entrará como sócio. "É uma operação de mercado, sem recursos públicos, sem recursos subsidiados. O Bndes seria sócio dessa empresa com objetivo de lucro." Ainda de acordo com ele, o banco cumpre o seu papel quando colabora para a internacionalização de uma empresa nacional. "Não há nada de ilegal nessa operação. É o Bndes ajudando uma empresa nacional a ser mundial."

Em comunicado divulgado terça-feira, o Bndes confirmou que começou a analisar o pedido de financiamento para internacionalização do Grupo Pão de Açúcar. A operação de internacionalização, no valor de até € 2 bilhões, permitirá ao grupo assumir posição estratégica no supermercado Carrefour, considerado um dos maiores varejistas mundiais. Segundo o Bndes, a transação poderá abrir "caminho para maior inserção de produtos brasileiros no mercado internacional".
Alas destaca que Pão de Açúcar não atua no Estado

"Em tese, quanto mais empresas no mercado, mais competição, melhor atendimento e melhores preços para o consumidor", afirmou João Carlos de Oliveira, presidente da Associação Latino-Americana de Supermercados (Alas). Segundo Oliveira, juntos o Carrefour e o Pão de Açúcar deverão representar cerca de 30% do mercado.

O dirigente lembra que o Pão de Açúcar não tem unidades no Rio Grande do Sul, terceiro principal mercado brasileiro e que o varejo gaúcho tem como principal característica o fato de ser forte localmente. Quanto à concorrência, Oliveira acredita que as grandes redes regionais serão as mais afetadas pela junção das operações.
Abras afirma que competição não será afetada com união das redes

A competição no setor de supermercados seria mantida caso uma possível fusão entre as operações brasileiras do Carrefour e o Grupo Pão de Açúcar fosse realmente concretizada. Segundo o presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Sussumu Honda, "uma concentração, em termos de mercado, de cerca de 30% não é nenhum ‘bicho de sete cabeças’". "Há uma concentração (de lojas do Carrefour e Grupo Pão de Açúcar) em São Paulo, mas no restante do País a situação é diferente", afirmou.

"Para o consumidor é importante ter competição, e vamos continuar competitivos", afirmou. Honda evitou fazer maiores comentários sobre a possível fusão, mas salientou que, caso a negociação seja concretizada, a entidade prestará esclarecimentos sobre a concentração do setor aos órgãos de defesa da concorrência.

Há um mês, o dirigente da Abras declarou, após os primeiros rumores de negociação entre os executivos das varejistas, que o mercado se "adaptaria" à fusão do Carrefour e do Pão de Açúcar. "Na indústria, a concentração em alguns produtos é extremamente forte, mas isso não impede a competição", disse à época.

Segundo a Abras, a participação das vendas das maiores empresas do setor de supermercados no Brasil, leia-se Pão de Açúcar, Carrefour e Walmart, passou de 40%, em 2009, para 43% no ano passado. Embora a concentração avance, ainda está longe da realidade na Europa, onde as cinco maiores redes respondem por 70% a 80% das vendas, destacou a Abras.

O aumento na concentração entre os anos de 2009 e 2010 foi impulsionado pela associação do Pão de Açúcar com a Casas Bahia. O dirigente acrescentou ainda que, excluídas as operações de bens duráveis do Pão de Açúcar, com as bandeiras da Casas Bahia e Ponto Frio, a concentração seria menor.