Ciência

04/10/2010 – Atualizado em 31/10/2022 – 9:25am

Pode ser poético dizer que um cão encheu seu dono de beijos quando ele voltou de viagem, mas a realidade, estão descobrindo os cientistas, não é assim tão fofa.

Isso porque cachorros são extremamente sensíveis a cheiros e sabores — coisas tão importantes para eles quanto a comunicação verbal ou a visão para os humanos.

Assim, quando um dono volta da rua cheio de novos cheiros e gostos, seja da mão daquele colega de trabalho que foi cumprimentado ou da sujeira do banco de metrô em que sentou, ele está oferecendo ao seu cachorro um festival de sensações.

Se seu cão quer saber por onde você andou, isso significa, claro, que ele vê algo de especial em você. Mas eles gostam de cheirar e lamber mesmo desconhecidos.

“Saber do papel do odor para eles mudou minha forma de pensar sobre a maneira alegre com que minha cachorra cumprimentava um visitante, indo diretamente na região genital dele”, diz Alexandra Horowitz, da Universidade Columbia (EUA).

O comportamento da cachorra de Horowitz, que está lançando no Brasil o livro “A cabeça do cachorro” (BestSeller), faz todo sentido, diz.

As regiões genitais, assim como a boca e os sovacos, produzem muitos odores — e logo ensinamos às crianças a importância de lavá-las bem. Estando a boca e os sovacos geralmente mais distantes do cachorro, não é difícil imaginar que área ele vai atacar.

“Não deixar que um cão cheire um visitante equivale, entre humanos, a vendar-se na hora de abrir a porta para um estranho”, diz a cientista.

Para um cão, cada pessoa tem um cheiro inconfundível, o que faz com que eles nos identifiquem pelo odor. Humanos conseguem usar o nariz para saber, por exemplo, se alguém fumou, mas cachorros vão muito além.

Eles podem saber se você fez sexo, e até saber quem e quantas pessoas estavam junto. Ao se aproximar da sua boca, conseguem identificar o que você comeu.

Mais do que isso, cachorros sentem cheiro de medo.

“Gerações de crianças foram alertadas para nunca mostrar medo diante de um cão estranho”, diz Horowitz.

Não era à toa. Quando assustados, suamos, e o odor do nosso corpo entrega o pavor. Além disso, a adrenalina é inodora para nós, mas não para bichos de faro aguçado.

O olfato dos animais é tão bom que os cientistas querem utilizá-los na medicina.

Um estudo treinou cães para reconhecer a urina de pacientes com câncer. Os cientistas se assustaram. Os cães aprenderam a “diagnosticar” a doença: só erram 14 vezes em 1.272 tentativas.

Não se sabe direito quais substâncias eles aprenderam a reconhecer, mas alguns cientistas propõem “cães doutores” — pelos estudos feitos, eles acertam mais que muitos doutores humanos.

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Cachorros solitários enfrentam tédio diário, aponta cientista

Se os cães não lambem por saudade, também pode não ser por amor que eles ficam esperando junto à porta. Quando o dono sai para trabalhar o dia inteiro, o cachorro fica sem muito o que fazer sozinho em casa — a volta do humano que vive com ele, então, pelo menos acaba com o marasmo.

“A falta de ocupação compromete a sanidade mental do animal e a integridade das meias do dono”, diz Alexandra Horowitz, da Universidade Columbia (EUA). Ela sugere deixar guloseimas escondidas para que o bicho gaste o tempo tentando achá-las.

A falta de compromissos, porém, faz com que os cães respeitem mais as vontades do seu corpo — como aquele sono após o almoço, que humanos também sentem.

“Sem nenhuma papelada para revirar, nenhuma reunião para participar, os cães cochilam”, diz Horowitz.

Mesmo que a siesta dos bichos possa dar inveja, ser um cão, porém, tem outras desvantagens além da chance de sentir tédio.

Horowitz cita como exemplo as lâmpadas fluorescentes compactas, aquelas que as pessoas compram para economizar energia.

Elas produzem um zumbido inaudível para quem foi no supermercado comprá-las, mas que pode incomodar os cães, que escutam mais frequências do que nós.

Mais do que as lâmpadas, entretanto, os cães encontram uma inimiga de verdade é nas capas de chuva para eles, que se tornaram moda recentemente, à venda em qualquer pet shop.

Existem dois problemas com elas. Um deles é que os cães já têm uma capa de chuva natural — apesar de muitos donos se sentirem, com motivo, um pouco incomodados quando um cachorro molhado chega em casa e se chacoalha todo para se secar.

O outro, pior, é que a capa faz com que os cães se sintam dominados. Ela cobre as costas, o peito e às vezes a cabeça do bicho. Nos cachorros e nos seus “primos”, como os lobos, a pressão nas costas e na cabeça está relacionada com a subordinação — por um outro animal mais velho, por exemplo.

“É possível que, com a capa, muitos cães fiquem imóveis por se sentirem dominados. Eles até podem cooperar para sair, mas não porque gostam da capa, mas sim porque foram subjugados”, diz Horowitz.